Grama verde, casa com chaminé, sol amarelo, árvore.
Quando se é criança sempre há motivos para colorir.
Um boneco grande de palito sorri: é meu pai.
Nos braços dele, uma bolinha pequena: é minha irmã bebê.
Um boneco pequeno de palito com cabelo amarelo também sorri: sou eu.
Outro boneco grande de palito: é minha mãe.
Ela ganha um sorriso, um vestido de triângulo e cabelos.
Cheios, cacheados, ruivos, alisados, castanhos, escovados, brancos, curtos.
A cada desenho feito, mudavam.
E mudava também o meu desenho.
Agora os bonecos são todos grandes e a casa não tem chaminé.
O sol amarelo se escondeu atrás do cinza.
Um cinza que eu já havia conhecido de outros cadernos.
Ele que agora invadira meu desenho.
Ele que agora invadira meu desenho.
E os cabelos da minha mãe começaram a cair.
Pouco a pouco indo para o chão, para a roupa, para a folha de papel.
O boneco de cabelos amarelos não sorri.
O boneco que já foi uma bolinha não sorri.
O boneco que envelhece em meu desenho não sorri.
E os cabelos da minha mãe continuam a cair.
Tentei fazer cabelo em fio azul, roxo, verde florescente.
Mas nada floresceu.
O sol se escondeu.
E os cabelos da minha mãe estão caindo.
Lentamente os bonecos se aproximam no papel.
Tocam os braços de palito um no outro.
Tudo está cinza.
O lápis amarelo está sem ponta.
No chão, os cabelos da minha mãe.
Mas nas cabeças dos bonecos há sorrisos.
Azuis, molhados de lágrimas de chuvas cinza.
E num lugar que eu não sei desenhar, eu voltei a ser criança.
Quando se é criança sempre há motivos para colorir.
Mesmo sem o amarelo na caixinha.
Ou com um cinza a permear a minha folha.
Porque para mim a minha mãe sempre vai ser meu boneco de palitos.
Com um vestido de triângulo, um sorriso.
E com os cabelos que um dia desenhei.
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